
Zoom in, zoom out: iniciativas locais e nacionais fortalecem o ecossistema de impacto
“Pensar globalmente, agir localmente”. A célebre frase do sociólogo alemão Ulrich Beck, estudioso do fenômeno da globalização, pode soar como um clichê, mas não envelhece. No campo dos investimentos e negócios de impacto, como em outros de interesse público, a ideia segue atual: é preciso fortalecer arranjos locais de impacto para que o ecossistema como um todo se fortaleça no país e no mundo.
Ao falar sobre apoiar empreendimentos que podem solucionar problemas sociais e ambientais, é fundamental mapear e fortalecer em diferentes escalas um ator muito relevante neste sistema: os dinamizadores de impacto. Isso significa atuar de forma colaborativa com quem conhece as particularidades de cada território, potencializar características únicas, atrair grandes investidores, encampar e induzir boas práticas de comunicação e processos inovadores de trabalho.
O evento que marcou a volta da Sexta de Impacto, uma iniciativa do ICE, discutiu sobre o assunto com convidados que compartilharam experiências, desafios e resultados. Realizado em abril no canal do ICE no YouTube, o encontro contou com a participação de Fernanda Bombardi, gerente-executiva do ICE e coordenadora da Coalizão pelo Impacto; Marcos Da-Ré, diretor de Economia Verde da Fundação CERTI e Marcos Pedote, co-fundador e diretor da Trê – Investindo com Causa.
Os casos discutidos são exemplos de como recomendações para o ecossistema de negócios de impacto da Aliança pelo Impacto para o período de 2020-2025 podem funcionar na prática. Ao apoiarem outras organizações para promover o desenvolvimento de negócios locais, atendem a recomendação número 1, de fomento aos dinamizadores de impacto. Ao trabalharem com os talentos, potenciais, cultura e realidade locais, incentivam o desenvolvimento de ecossistemas locais de impacto, como sugere a recomendação número 2.
Inovação é fundamental para impacto positivo
Os participantes trataram de diferentes temas relevantes para o campo de investimentos e negócios de impacto, como a inovação. Marcos Da-Ré, por exemplo, contou como a Fundação CERTI tem trabalhado com inovação como uma ferramenta importante para garantir o uso sustentável dos recursos da Floresta Amazônica, mantendo a mata em pé e conectando os ingredientes principais de qualquer ecossistema de negócios: pessoas, conhecimento, capital e mercado.
A Fundação é responsável pela Jornada Amazônia, que tem como principal objetivo fomentar o empreendedorismo de impacto na região, apoiando não só os negócios, mas também organizações de apoio ao empreendedorismo.

“Para a gente conseguir competir com outros usos do solo que acabam degradando a floresta nós precisamos de muita inovação, com diversidade e escala, e de empreendedorismo, que é o veículo que leva a inovação para a realidade.” – Marcos Da-Ré
Nos próximos cinco anos, a Jornada Amazônia almeja:
- Apoiar o nascimento e desenvolvimento de pelo menos 400 startups ligadas a causas da floresta;
- Com isso, conservar ao menos 1 milhão de hectares;
- Movimentar 400 milhões de reais com produção sustentável;
- Levar o tema de empreendedorismo de impacto positivo a mais de 40 mil pessoas.
A potência do conjunto
O princípio colaborativo no ecossistema de impacto vale-se do ditado popular ‘juntos vamos mais longe’. Isso porque muitas das questões que são o foco de negócios socioambientais de impacto estão muito longe de ser de simples resolução. Todas as inúmeras problemáticas relacionadas à educação no Brasil – desde infraestrutura básica, passando pela formação de professores até evasão escolar – não serão resolvidas por um único ator, seja pelo poder público ou por uma organização privada com grande poder econômico, por exemplo.
O mesmo raciocínio aplica-se à questão ambiental. Entretanto, abandonar a mentalidade do diferencial competitivo e começar a exercitar o trabalho colaborativo e a criação de valor compartilhado também não são tarefas fáceis, como explica Marcos Pedote da Trê – Investindo com Causa.

“O mundo carece de reestabelecermos essa relação de vínculos entre as pessoas. A maior força que temos é como conectamos seres humanos e organizações que, por mais que não saibam como resolver algo, têm o desejo de começar essa construção.” – Marcos Pedote
Com isso, o programa Territórios Regenerativos se coloca como uma possibilidade de unir diferentes atores e modelos de investimento para impactar positiva e simultaneamente um território e sua sociobiodiversidade.
Em 2021, o projeto Territórios Regenerativos:
- Captou R$ 1,4 milhão;
- Atuou em 3 territórios: Grande Reserva Mata Atlântica, Baía de Guanabara (RJ) e Mata da Várzea (Recife – PE);
- Selecionou 6 negócios.
O relatório anual da TRÊ traz mais detalhes sobre os próximos passos do programa, que tem como meta chegar a 20 territórios até 2030. Acesse.
Usar diferentes fontes de capital é um dos mecanismos adotados pelo programa da TRÊ, que utiliza conceitos como blended finance, combinando recursos da filantropia e de investimentos.
Um processo de captação de recursos deu origem a um fundo filantrópico, que, ao mesmo tempo, doa recursos para a estruturação de negócios em estágio inicial, e empresta recursos para outras soluções em estágio mais avançado no modelo de capital paciente. O retorno dos empréstimos é aplicado em outros negócios.
Outra vertente é o engajamento da sociedade, que pode participar de financiamentos coletivos no caso de propostas mais estruturadas. Para Pedote, é um movimento de expandir para além dos investidores profissionais e trazer também a sociedade, incentivando a percepção de outra forma de exercer o protagonismo e cidadania.
Conservar com impacto
Uma iniciativa que usa princípios comuns à Jornada Amazônia e ao programa Territórios Regenerativos é a plataforma Parceiros pela Amazônia (PPA). Liderada pelo setor privado e organizada em grupos temáticos (empreendedorismo, bioeconomia, mercados e territórios), visa fomentar soluções de desenvolvimento sustentável para a Amazônia.
Já são 50 parceiros envolvidos entre pequenas, médias e grandes empresas, organizações da sociedade civil e apoiadores internacionais. Em 2021, foram mobilizados mais de R$ 109 milhões, mais de R$ 46 milhões coinvestidos e 2.637 empregos gerados pelos negócios.
Ações locais para construir um olhar nacional para impacto
Iniciativas de caráter regional, as duas propostas têm a capacidade de contribuir com experiências e conhecimento acumulado em propostas com perspectiva nacional, como é o caso da Coalizão pelo Impacto, uma iniciativa do ICE, Instituto Helda Gerdau, Instituto humanize e Somos Um, com parceria estratégica da Cosan, Fundação FEAC, Fundação Grupo Boticário, Instituto Sabin e Raia Drogasil.
A Coalizão irá atuar nas duas escalas. Em nível local, a ideia é fortalecer alguns atores estratégicos do ecossistema de impacto – como incubadoras e aceleradoras, parques tecnológicos, universidades, Sebraes, governos, empresas e investidores locais -, e constituir uma governança para tomar decisões estratégicas.

“Planos prontos não funcionam. O sucesso acontece quando há coconstrução com atores locais. Assim as necessidades e aspirações das pessoas em cada território aparecem e elas vêem respostas e sentido no que está sendo feito”. – Fernanda Bombardi, ICE
Em nível nacional, a Coalizão pretende reunir organizações representando cada localidade para criar um espaço de troca de conhecimentos e aprendizagem, proporcionando reflexões críticas e inspirações para todos os parceiros envolvidos e para o próprio ecossistema de impacto brasileiro.
Metas da Coalizão pelo Impacto:
- 6 ecossistemas de empreendedorismo de impacto fortalecidos e estruturados até 2026 nas 5 regiões do Brasil – Fortaleza – CE, Belém – PA, Brasília – DF, Campinas – SP, Paranaguá – PR e Porto Alegre – RS;
- Projeção inicial de R$ 23 mi alocados ao longo do projeto, impulsionando até 600 negócios de impacto.
[Informação atualizada em 2/05/2022]