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Workshop debate metodologias e cases de avaliação de impacto
O Encontro Nacional 2017 do Programa Academia ICE dedicou um dia inteiro ao Workshop de Avaliação de Negócios de Impacto, que reuniu docentes universitários, gestores de aceleradoras e incubadoras, empreendedores, investidores e outros atores do ecossistema de finanças sociais, todos empenhados em discutir conceitos, metodologias e estratégias de avaliação de impacto.
O Workshop foi conduzido por Daniel Brandão, da Move Social, que fez uma exposição sobre os fundamentos das métricas em negócios de impacto social.
Além de discussões teóricas, os participantes do Workshop puderam conhecer em detalhe cases expostos por Fernando Assad (Vivenda) e Laís Rocha (Geekie)que após um exercício prático de avaliação dos indicadores falaram sobre os resultados das avaliações de impacto realizadas em suas empresas.
Laís Rocha contou que na avaliação feita pela Metas Sociais o uso do Geekie Games teve um impacto de 72 pontos TRI na nota do aluno. Para saber o que isso significa, foi feito um comparativo entre os resultados de três anos de Enem, no qual verificou-se que o gap entre as notas dos alunos de escolas públicas e as dos alunos de escolas privadas era de 70 pontos. “Então, quando falamos de 72 pontos, a gente está dando oportunidade ao aluno de escola pública de se equiparar, de ajustar essa diferença que ele tem”, disse Laís.
A premissa era de que o uso do Geekie teria mais impacto para os alunos que enfrentam condições desfavoráveis de educação, por exemplo aqueles que precisam conciliar trabalho e estudo. Para o aluno de cursinho, que tem tempo, o impacto foi menor, mas para o que estuda no ônibus o impacto foi maior. O impacto também foi maior para o aluno de escola pública. O estudo mostrou que existe relação entre a escolaridade da mãe e a condição do aluno. Quanto maior a escolaridade da mãe menor o impacto.
O objetivo da avaliação foi provar os resultados para os sponsors, o Ministério da Educação, para o próprio aluno e para a sociedade em geral. “A gente ficou muito feliz com os resultados, embora tenha encontrado desafios. Por exemplo, essa avaliação não foi suficiente para a renovação. Este ano o Geekie Games não faz parte do programa do Enem. Outro desafio é que ainda não encontramos a melhor forma de comunicar esses resultados ao aluno.
No caso da Vivenda, Fernando Assad relata que iniciou o processo de avaliação de impacto no momento em que percebeu que não sabia o que era impacto e desccobriu uma série de problemas relacionados com a natureza do nosso negócio. “Tivemos aquela fase em que o problema era manter o negócio em pé. A gente financia a reforma para o morador, entrega a vista e recebe em 30 vezes. Então nosso fluxo de caixa era um problema”.
Assad e seus parceiros sabiam que precisavam da avaliação para resolver esse problema, mas ao mesmo tempo começaram a se perguntar se estavam “olhando para os motivos que os fizeram começar essa história”. Era preciso provar que a reforma tem um efeito na vida das famílias. Ao fazer uma reforma, a Vivenda estabelece uma relação com os moradores. Alguns são beneficiários, outros são clientes.
“Quando entendemos isso, a gente começou a se debruçar sobre essa questão. Fomos provocados por um parceiro, o Instituto Phi, que doa reformas mensalmente. Primeiro, para ver se os recursos que eles fornecem estavam sendo empregados onde eles imaginavam que seria, segundo, para a gente avaliar o impacto sobre as famílias”, relatou Assad.
No começo a Vivenda tinha kits de reforma relacionados com a questão de saúde: impermeabilização, ventilação, revestimento, iluminação. Em um ano e meio ninguém comprou isso. “As pessoas chegavam e diziam: “quero um banheiro novo, uma sala nova, um quarto novo. Aí a gente foi entendendo que precisava empacotar esse nosso produto de uma maneira diferente, por causa da nossa missão e por conta do impacto que a gente queria gerar”, lembrou Assad.
Essa percepção fez com que a Vivenda pensasse em uma avaliação mais estruturada, apesar das dificuldades para pagá-la. A empresa sugere que a Academia e a indústria deveriam olhar mais para o negócio da habitação. Atualmente, a Vivenda já está na segunda avaliação de impacto, que está sendo feita pela Fundação Getulio Vargas. Na primeira, executada pela Plano CDE, procurou respostas para duas questões: “Dado que a reforma tem um custo, ela seria uma prioridade para a família?”; e “Qual o impacto que a reforma gera na vida das pessoas”.
A resposta para a primeira questão foi sim. Mas obter esse sim foi um megadesafio, pois foi preciso que as famílias se dispusessem a falar da própria intimidade. Para 100% das pessoas a casa é o primeiro foco de investimento, por conta da segurança dos filhos e do conforto da família. Porém, a casa tem outros problemas. A pessoa ouvida falava muito em questões relacionadas à sujeira, que se relaciona com a saúde.
Outro aspecto mencionado pelas famílias quando o assunto é reforma é a questão da privacidade. “Somos muito procurados para dividir cômodos ocupados por pais e filhos, resolver o problema de ambientes sem porta ou com janela quebrada. Aí a privacidade da família dentro de casa é completamente corrompida”, afirmou Assad.
Uma segunda questão se relaciona com a autoestima e sociabilidade, como a reforma colabora para as relações familiares. Outro ponto é a praticidade e bem-estar, que se liga a limpeza e faxina. “A casa reformada com um piso novo permanece limpa por mais tempo. É um ambiente em que a mãe pode deixar a criança brincar, se desenvolver e aprender. Em quarto lugar e quase irrelevante, na percepção das famílias, aparece a questão da saúde.
Houve uma descoberta interessante, que a Plano CDE chamou de faísca para a transformação. A partir de uma reforma, a família resolve fazer outras coisas que vão gerando um círculo virtuoso de desenvolvimento e bem-estar.
Esses foram os resultados de uma pesquisa qualitativa. Agora a Vivenda está concluindo uma pesquisa quantitativa, em parceria com a FGV, para explorar mais todos esses pontos com os moradores e ver quais são os indicadores que devem ser acompanhados e como levar esses resultados para o usuário, a fim de melhorar sua relação com a plataforma.
Perspectivas para a avaliação
Depois de uma manhã tão rica, os participantes do Workshop tiveram uma sessão à tarde para ouvir exposições sobre “Perspectivas para a avaliação: objetivos de desenvolvimento sustentável e a experiência de fundos de investimento”, feitas pela antropóloga Luciana Aguiar, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), órgão da Organização das Nações Unidas (ONU), criado para promover o desenvolvimento e eliminar a pobreza no mundo; e pelo especialista em finanças Denis Nakahara (Mov Investimentos); e outra sessão com Sérgio Lazzarini (Insper Metricis), sobre o papel de cada ator na agenda de avaliação de impacto.
A Agenda 2030 é vista como uma grande oportunidade, seja para os negócios ou para as políticas públicas, por abarcar um conjunto de ações que as organizações já fazem. É também uma agenda de planejamento e uma grande teoria de mudança, “um roteiro do mundo que queremos ter”. Mas se trata de uma agenda que precisa ser implementada, colocada em prática.
No Brasil, as inovações são extremamente importantes para implementar essa Agenda e os negócios de impacto estão mais bem posicionados para desenvolver produtos e serviços que atendam as lacunas de mercado e para atender uma agenda que não é só governo, embora exista uma ausência de soluções de negócio que interessam às populações mais pobres. Há uma perda de oportunidades para negócios que atendam as populações mais pobres, que estão muito mal servidas, com produtos e serviços que não foram desenhados segundo suas necessidades.
Seguindo a mesma temática, Denis Nakahara disse que o framework da MOV começa nos ODS para 2030, que “ajudam todo mundo a mirar no mesmo gol ¬— sociedade civil, terceiro setor, governo, pequenos negócios, universidade, todos a chutar a bola na mesma direção”. A partir dos ODS, a MOV desce um nível para dimensionar necessidades e oportunidades em determinada comunidade, país, região, continente. “A gente sabe que há terceiros atuando, vivemos num ecossistema dinâmico, que podem estar ajudando a alcançar esses ODS globais ou, muitas vezes, atrapalhando. Uma vez que identificamos e dimensionamos essa necessidade/oportunidade, partimos para o desenho de uma teoria de mudança calcada em dois pilares: tino empreendedor e modelo de negócio. “Depois verificamos os outputs, os indicadores que conseguimos mensurar para ver se estamos caminhando na direção imaginada.”.
A MOV acredita que “it takes an ecosystem to make a change” (é preciso um ecossistema para fazer uma mudança). Não basta o investimento que a MOV vai colocar em determinado negócio que vai mudar um problema ou determinado setor. É essencial ter consciência de que é preciso trabalhar em rede. Com outputs e atividade do ecossistema a gente chega nos outcomes (ODS).
Exemplo desse procedimento é a Terranova, empresa financiada pela MOV, que contribui para a erradicação da pobreza e cidades sustentáveis com a seguinte teoria de mudança: mediando conflitos fundiários e promovendo acesso aos direitos de propriedade para populações vulneráveis, a Terranova evita desapropriações, recupera e distribui o valor da propriedade e promove capacitação, fortalecimento das comunidades e melhores condições de vida.
O Brasil tem entre 12 milhões e 18 milhões de pessoas, cerca de quatro milhões de famílias, que vivem em áreas ocupadas irregularmente, sendo 50% em terras públicas e 50% em terras privadas. Este é o tamanho do problema no país. A Terranova atua principalmente em terras privadas, ao identificar essas áreas, intermediar as negociações entre proprietários e esses ocupantes e costurar acordos judiciais para serem homologados na Justiça. “ O que a gente vai mensurar? O número de famílias homologadas em relação ao tamanho do problema ou da oportunidade, que envolve um milhão de famílias. Tudo isso valoriza ativos mortos. Uma área invadida não tem valor de mercado. Ao ser regularizada adquire valor. E aqui há uma série de atividades que são do ecossistema que não irão necessariamente contribuir de uma forma direta para o output, mas indiretamente sim: disseminar a metodologia de regularização fundiária entre as prefeituras, o governo federal e os tribunais de justiça, ajudar no desenho de instrumentos financeiros que permitam a essas famílias a adquirirem os seus lotes etc.
A importância da terceira parte
A importância da avaliação ser feita por uma terceira parte foi ressaltada no Workshop por Sérgio Lazzarini, professor titular do Insper, que também coordena o Insper Metricis, núcleo de medição para investimentos de impacto socioambiental, um dos autores do “Guia para Avaliação de Impacto Socioambiental para Utilização em Investimentos de Impacto”, que também foi distribuído aos participantes do Workshop.
De acordo com Lazzarini, à medida que se realizam ações e contratos com metas e indicadores de desempenho, como os realizados na Inglaterra para reduzir o índice de crimes praticados por ex-presidiários, surge a necessidade de uma terceira parte. Não é o investidor nem o empreendedor, não é o financiador, não é a aceleradora. É uma terceira parte que vai olhar para essas metas e dizer objetivamente se elas foram atingidas ou não.
A partir dessa ideia, Lazzarini resolveu criar em 2015 um centro para estudar esses problemas e ajudar nesses contratos. Assim nasceu o Insper Metricis, com apoio do ICE, Fundação Rockefeller, Avina e Omidyar, com o objetivo de estudar investimentos de impacto e metodologias de avaliação de resultados com uma abordagem multidisciplinar.
O Insper Metricis atua, sem fins lucrativos, como terceira parte, para fazer validação se a meta foi atingida ou não e também estimula outras instituições de ensino e profissionais a fazer esse trabalho, já que não tem condições de atender toda a demanda, que às vezes vem do doador, do contratante e do empreendedor. O processo é difícil e custoso. Para ajudar a superar esse obstáculo, o Insper Metricis resolveu fazer o Guia e atender os interessados para discutir eventuais problemas no processo avaliação. Também procura envolver os alunos de graduação do Insper nessa atividade de avaliação e pensa em fazer parcerias com empresas júnior de outras universidades. Além disso, Lazzarini constituiu uma rede de profissionais para realizar discussões mensais, projetos e cursos sobre medição de impacto.