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Compras governamentais e negócios de impacto
No começo dos anos 2000, o Governo do Reino Unido convocou gestores do mercado financeiro para compartilhar um desafio: atrair mais capital privado para financiar soluções inovadoras para a resolução de problemas sociais – que se somariam aos esforços dos investimentos governamentais e da filantropia. Investidores foram atraídos pela possibilidade de juntar impacto social (monitorado e comprovado) com um retorno financeiro (não necessariamente com taxas de mercado, mas diferente de zero). A viabilização deste co-investimento foi possível, também, pela emergência de novos modelos de empreendimentos, os chamados negócios de impacto, que têm a missão explícita de gerar benefícios sociais e/ou ambientais ao mesmo tempo em que proveem resultado financeiro positivo e de forma sustentável. Os negócios de impacto podem assumir diferentes formatos legais: associação, fundações, cooperativas ou empresas.
As finanças sociais se constituíram como um campo que busca diferentes capitais (públicos e privados) para implementar modelos de negócio que podem resolver problemas sociais. O ecossistema ao redor dessa agenda inclui atores da Oferta de Capital, que decidem alocar capital com o binômio impacto e performance financeira, atores da Demanda (os negócios de impacto) e Intermediários, que conectam a oferta e a demanda, como aceleradoras e incubadoras, universidades, consultores. Importante também destacar o surgimento ou adaptação de Mecanismos Financeiros que ajudam a viabilizar este fluxo de capital.
Este campo avançou muito no mundo. Em 2013, todos os países do G7 criaram suas Forças Tarefas de Finanças Sociais com planos concretos para destravar e avançar temas estratégicos – algumas delas lideradas pelo Governo, outras pela sociedade civil. Na América Latina, Brasil, México, Argentina, Paraguai, Uruguai e Colômbia criaram suas Forças Tarefas nos últimos três anos.
No Brasil, temos acompanhado o aumento de investidores que buscam impacto socioambiental e o crescente surgimento de empresas que querem resolver problemas sociais, atuando em áreas como reformas de casas populares, clínicas de saúde a baixo custo, plataformas de educação adaptativa que ajudam estudantes a melhorar suas performances no ENEM, serviços de microfinanças, aplicativos para tradução para libras etc. Esses empreendimentos, além de terem clareza e comprometimento com a mensuração de algum indicador socioeconômico, vendem produtos ou serviços para empresas, governo ou usuários diretos. E, ainda que possam depender de doação para parte de suas operações, visam gerar receita própria e sua sustentabilidade – que pode ser reinvestida no negócio ou distribuída para eventuais investidores.
O histórico tem mostrado que o poder público pode se envolver nesse campo com três papéis:
- Como Fomentador das temáticas e práticas das finanças sociais, como empreendedorismo social, aceleração e incubação e avaliação de impacto.
- Como Regulador, buscando um ambiente legal favorável à alocação de capital em investimentos que tenham impacto socioambiental, parcerias público-privadas de impacto, proteção a investidores etc.
- Como Comprador de produtos e serviços provenientes de negócios de impacto.
Na pesquisa “Inclusão de Negócios de Impacto nas Compras de Grandes Empresas e Governo”, realizada pela FGV-EAESP a pedido da Força Tarefa de Finanças Sociais, o professor Fernando Burgos cita que os principais desafios do governo Comprador estão ligados ao desconhecimento do tema e à complexidade jurídica, que deixam inseguros os responsáveis pelas compras públicas.
Vale citar a dificuldade de diferenciação de um negócio de impacto de um negócio tradicional em um processo de convênio ou de licitação pública (Lei 8.666/93); ou o caso de tecnologias sociais inovadoras, e por isso ainda sem concorrentes diretos, de difícil classificação nas normas de licitações.
Esse campo pode ser uma alavanca para as políticas públicas, considerando aspectos como:
- Investimento em inovações / tecnologias apropriadas à resolução de problemas sociais complexos.
- Estabelecimento a priori de metas sociais em ações, projetos e negócios.
- Aumento do número de investidores e empreendedores que buscam entender os problemas sociais e que poderiam co-investir ou empreender novas formas de resolvê-los ou somar às soluções existentes.
- Levantamento e monitoramento de custo unitário dos serviços públicos (para que empreendedores identifiquem oportunidades de intervenção e para que gestores públicos avaliem, qualifiquem e comprem gerando o melhor atendimento à população a um melhor custo).
- Diferenciação e mensuração de resultado e impacto no âmbito social.
- Estímulo a agendas de co-investimento público-privado em soluções de prevenção (clareza de economias do orçamento público e impacto futuro claro).
- Revisão de formatos e abrangências de parcerias público-privadas.
- Possibilidade de testar a efetividade de novos formatos para a política pública – seja pela economia de gastos ou testando novas práticas e seu impacto antes de escalá-
- Ampliar o debate sobre o pagamento por performance no setor público.
Um olhar propositivo para o campo das compras governamentais e negócios de impacto passa por estudar as legislações, identificar oportunidades, testar previamente as teses de impacto dos projetos e construir casos de sucesso que possam ser divulgados e multiplicados, informando e capacitando os gestores públicos sobre este novo campo.
Adicionalmente, é preciso trabalhar com o Ministério Público e órgãos de controle (Tribunais de Contas, Advocacia e Controladorias) para encontrar formas de incentivar o fornecimento por meio de negócios de impacto sem ferir a legislação vigente e reduzir a complexidade jurídica de inovações no setor público.
*Instituto de Cidadania Empresarial e Oficina Municipal