This website uses cookies so that we can provide you with the best user experience possible. Cookie information is stored in your browser and performs functions such as recognising you when you return to our website and helping our team to understand which sections of the website you find most interesting and useful.
Formatos inovadores ampliam o fluxo de recursos para negócios de impacto social
Os investidores têm olhado de forma inovadora para o investimento de impacto social? Quais são os mecanismos financeiros capazes de canalizar o fluxo de recursos entre quem quer investir no campo social e quem precisa desses recursos? Essas questões foram debatidas durante a sessão plenária “Formatos Inovadores para atrair recursos para impacto”, realizada no dia 4 de agosto durante o Fórum de Finanças Sociais e Negócios de Impacto – Investir para Transformar, iniciativa do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE) e da Vox Capital.
“O tema investimento de impacto é relativamente novo, tem cerca de 20 anos”, lembrou Beto Scretas, moderador da sessão. “Nasceu do fato de que os canais tradicionais de financiamento social – filantropia e governo – não davam conta do tamanho do desafio social dos diversos países. Surge então a ideia do capital privado para financiar o campo social ou tornar mais eficaz o gasto público em temas sociais”. Mas como fazer esses recursos fluírem do bolso privado ou do bolso público para o campo?
Além de ampliar o fluxo, é importante avaliar o momento em que o investimento é realizado. Em geral, a maior taxa de mortalidade dos negócios de impacto acontece após a fase de incubação e de aceleração, quando as empresas ainda não têm musculatura suficiente para conseguir dinheiro de um fundo ou acessar crédito bancário.
Participaram dessa plenária Maria Rita Spina Bueno, diretora-executiva da Anjos do Brasil (organização sem fins lucrativos criada para fomentar o crescimento do investimento-anjo, apoiando o desenvolvimento do empreendedorismo de inovação); Andrea Armeni, cofundador e diretor-executivo da Transform Finance (organização que usa o capital como ferramenta para a mudança social transformadora, apoiando investidores e agentes de mudança com aconselhamento sobre novas ferramentas, métricas e estruturação de investimento); Carlo Pereira, gerente de Sustentabilidade da CPFL; e Frederico Rizzo, fundador do Broota (plataforma online que permite o contato entre empreendedores que buscam capital e pessoas que querem investir. A empresa foi pioneira em equity crowdfunding no Brasil).
Simplificação do processo e preservação da missão
“Quantos de vocês diriam que é difícil levantar recursos de um fundo de investimento?”, perguntou à plateia do Fórum Andrea Armeni, da Transform Finance, que lidera uma rede de investidores nos Estados Unidos com US$ 1 bilhão sob gestão. A resposta, em forma de muitos braços levantados na plateia, deixou clara a dificuldade.
“Os fundos em geral precisam de 15% de retorno. E a realidade é que apenas 10% a 15% das empresas conseguem. Muitas vezes os fundos só investem se consideram a empresa algo semelhante a um Uber. Com isso, as empresas não conseguem crescer ou são obrigadas a abrir mão de sua missão, mesmo que sejam viáveis do ponto de vista do investimento”, afirmou Armeni.
Na Transform Finance, segundo Armeni, o que se procura é trabalhar os investidores de forma estruturada, a fim de fazer com que os recursos cheguem aos negócios da melhor forma, sem prejudicar os empreendedores.
Para facilitar o caminho, a Transform Finance trabalha por exemplo a ideia de empréstimos baseados no faturamento, ou seja, a parcela é uma porcentagem do faturamento e o pagamento acontece em dois ou três anos, dependendo do resultado dos negócios. Outras alternativas são participação via ações ou ainda com base na distribuição de dividendos. A Transform Finance procura simplificar ao máximo o processo, preservando a missão pretendida pelo negócio e mensurando o impacto e os caminhos de saída do investimento.
Confira também a entrevista concedida por Andrea Armeni para a Folha de São Paulo.
Investimentos via equity crowdfunding
Criar mecanismos que facilitem o acesso ao capital para investimentos de impacto é também a missão do Broota, ao oferecer uma plataforma para startups com ou sem fins lucrativos que busca resolver muitas das ineficiências que existem no acesso ao capital semente. “Em um ano e 10 meses mobilizamos no Broota pouco mais de R$ 9 milhões para 35 empresas, uma boa parte delas com um propósito social bem forte”, revelou Frederico Rizzo, fundador.
Além da perspectiva financeira, Rizzo observa que os investimentos na plataforma, na base de equity crowdfunding, são atraídos também pela paixão e engajamento, pelo interesse em participar na comunidade. “São investidores que buscam tanto maior retorno quanto maior impacto social”, afirma. Entre os cases de sucesso que receberam investimentos na plataforma estão os negócios de impacto Vivenda, Impact Hub, Carbono Zero Courier, QMágico e muitos outros. A plataforma Broota tem sempre um investidor âncora, como Artemisia e InterCement, por exemplo.
O trabalho do Broota foi desenvolvido a partir de uma visão muito clara: a de que o processo é difícil para os dois lados. Para o empreendedor, é complexo entender os termos, a negociação, como funciona. Para o investidor, há o tempo necessário para encontrar bons negócios, os custos da transação, contratos com os quais não estão acostumados e os riscos envolvidos.
Para facilitar o fluxo de capital para os novos negócios, a plataforma Broota busca resolver essas ineficiências, com base em três propostas de valor:
- Diminuição da barreira de entrada para que novos investidores acessem esses novos negócios, o que significa reduzir o tíquete de investimento para o investidor-anjo – em vez de R$ 20 mil a R$ 30 mil, por exemplo, é possível investir a partir de R$ 1.000,00. Acesso a negócios pela internet, independente da geografia, sem custos.
- Mobilização das redes sociais, alavancando com criatividade as conexões que existem para a realização dos investimentos.
- Construção de estruturas que viabilizem a chegada do novo capital às organizações.
Em relação às redes sociais, Rizzo considera que podem alavancar o relacionamento. “Procuramos trabalhar com o conceito de um capital mais comunitário, o community capital, como existe nos Estados Unidos. O acesso acontece não só em relação a recursos financeiros, mas a competências e a empreendedores com empatias específicas. Essas conexões permitem que o capital chegue mais facilmente”, afirma Rizzo. Investidores líderes ajudam a organizar os demais, a partir da formação de um sindicato.
Realizar investimento em uma empresa iniciante com centenas de investidores poderia acarretar uma governança inviável. Por essa razão, os investidores da plataforma Broota são organizados em minifundos. Ao final, a sociedade investida tem um único fundo, uma sociedade de propósito específico. O investidor aloca capital e desembolsa o recurso quando de fato achar um negócio atraente. “Investidores como o sindicato Din4mo, por exemplo, investem em três a quatro negócios por ano e trazem outros investidores”, explica Rizzo.
Mais investidores-anjo e diversidade
Em várias frentes, não só os formatos têm sido mais inovadores, mas a expansão caminha a passos rápidos. Segundo Maria Rita Spina Bueno, diretora-executiva da Anjos do Brasil, o investimento-anjo, que começou há cerca de 70 anos, tem crescido muito nos últimos anos – dobrou na Europa, triplicou no Canadá e nos EUA correspondeu a mais de US$ 24 bilhões em 2015. “Isso significa uma chance de sucesso maior. A empresa que recebe investimento-anjo tem 20% a 25% mais chances de ter resultados melhores. Por essas razões, eu tenho uma relação de amor com o investimento-anjo”, destacou Maria Rita.
Ainda é difícil saber qual o percentual de investidores-anjo que investem em negócios de impacto mas, segundo Maria Rita, é nítido que esse segmento tem um potencial gigantesco: “Não existe um investidor-anjo que invista só com interesse de retorno financeiro”. Ela acredita que é cada vez maior o entendimento de que é preciso dar um passo à frente, falar de investimentos com propósito, voltados a negócios que têm retorno financeiro e impacto social e ambiental, resolvendo problemas reais.
O que tem crescido também é a participação das mulheres, ainda pouco representadas entre os investidores-anjo. Na Inglaterra, apenas 5% são mulheres; nos Estados Unidos, cerca de 20%. “As mulheres agregam um ponto de vista diferente, têm mais sensibilidade e podem trazer valor a essa relação, levando em conta que investimento-anjo é relacionamento”, disse Maria Rita.
Quanto maior a diversidade, segundo ela, melhor. Basta olhar para o Vale do Silício, nos Estados Unidos, que reúne pessoas de todo o mundo. “A presença de mais investidores-anjo e de mais mulheres olhando para negócios de impacto tem a possibilidade de mudar o nosso país, de transformar a maneira como a gente faz negócios, criando uma sociedade mais colaborativa e mais equilibrada”. Para encerrar, Maria Rita fez um convite aos participantes do Fórum: “As vezes tudo parece muito distante e as pessoas acham que não podem investir. Mas há muitas possibilidades. Ajudem a gente a construir o futuro”.
Subcrédito social do BNDES
Essa construção, muitas vezes, passa por mapear as oportunidades existentes, inclusive na área pública. Foi o que fez a CPFL, empresa líder na distribuição de energia no país ao recorrer ao subcrédito social do BNDES.
O recurso é disponibilizado pelo banco com o objetivo de “financiar investimentos destinados à implantação, expansão e consolidação de projetos e programas de investimentos sociais realizados por empresas, associações ou fundações, isoladamente ou em parceria com instituições públicas ou associações de fins não econômicos, que objetivem a elevação do grau de responsabilidade social empresarial e que sejam voltados para a articulação e o fortalecimento de políticas públicas desenvolvidas nos diferentes níveis federativos”. A linha oferece duas modalidades: apoio a investimentos no âmbito da comunidade e apoio a investimentos no âmbito da empresa.
Carlo Pereira, gerente de Sustentabilidade da CPFL, conta que, ao tomar conhecimento da disponibilidade desses recursos, a CPFL alinhou as premissas do BNDES às premissas da empresa e elencou áreas que considera prioritárias, como saúde e educação. “A CPFL tem uma área de distribuição grande de energia – no interior de São Paulo e norte do Rio Grande do Sul –, então buscou impacto tomando por base a comunidade, e não o empreendedor, principalmente nas áreas de saúde e educação”.
Pereira mostrou aos participantes do Fórum os 10 itens listado pelo BNDES que são passíveis de recursos por meio da linha (veja quais são esses itens final do texto). E perguntou: “Quantos de vocês têm projetos que poderiam atender a esses itens?”. Muitos braços se levantaram na plateia do auditório, respondendo que sim. “Esses são recursos, portanto, que vocês podem utilizar para proporcionar o impacto desejado. São recursos que fazem muito sentido para o ecossistema”.
Pereira lembrou, porém, que há dificuldades em relação ao fluxo interno do banco, uma vez que a área de negócios é a que dá o aval final; em geral trata-se de uma equipe mais técnica, que não entende muito da área social. Além disso, apesar dos 10 itens financiáveis, muito vai para obras. “Isso se dá porque a gente de fato precisa construir coisas? Eu diria que não em todo lugar”, afirmou Pereira.
O ecossistema como um todo, segundo Pereira, precisa discutir mais o subcrédito social, para ajudar a rever as linhas, deixar mais fácil para que as empresas desenvolvam projetos e o BNDES consiga aprovar. Além disso, deixou um conselho final importante aos empreendedores: “Utilizem as grandes empresas como vetor. Não cheguem só com a solução. Levem a solução e levem o dinheiro, porque muitas empresas não têm conhecimento de determinadas linhas de recurso das quais elas podem lançar mão. Há várias linhas disponíveis que podem ser utilizadas”.
Os seguintes itens são passíveis de apoio, pela linha Investimentos Sociais de Empresas, do BNDES, para ambas as modalidades no âmbito das comunidades e no âmbito das empresas:
- obras civis destinadas à instalação, expansão, reforma e outras benfeitorias relacionadas;
- aquisição de máquinas, equipamentos e materiais permanentes;
- tecnologia da Informação;
- serviços técnicos especializados;
- investimentos na implantação ou aprimoramento de sistema de gestão ambiental, social e/ou de saúde e segurança do trabalho, bem como na obtenção de certificações correlatas, no Beneficiário ou nas empresas de sua cadeia de fornecimento e distribuição;
- capacitação de equipe própria para estruturação de ações de responsabilidade social da empresa;
- despesas com qualificação voltadas para o aprimoramento da escolaridade até nível médio ou para a profissionalização de pessoas com formação escolar até nível médio;
- despesas operacionais do projeto social, desde que: (i) sejam essenciais para sua viabilidade; (ii) o apoio se dê em caráter temporário; e (iii) seja garantida a continuidade do projeto mediante indicação do respectivo responsável, que arcará financeiramente com essas despesas após esse período inicial;
- despesas administrativas com a equipe da empresa diretamente dedicada, limitadas a 5% do valor do projeto social; e
- desenvolvimento, difusão e reaplicação de tecnologias sociais aprimoradoras de políticas públicas.
Mais informações: