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Investimentos de fundações miram em mudanças sistêmicas e inovações
Um grupo pioneiro de fundações se uniu para refletir sobre o impacto de suas doações na redução de problemas sistêmicos. O que os unia, após anos buscando resolver problemas complexos, era a percepção de que precisavam mudar sua forma de financiar focada no apoio a programas com metas estabelecidas para investimentos em processos de mudanças sistêmicas considerando resultados que não poderiam controlar.
Entre estas fundações, que agora querem aprender com os resultados gerados conjuntamente a partir desta mudança em seus processos, estão Rockefeller, Young, Breuninger, McConnell, Robert Wood Johnson Foundation, Bosh e Calouste Gulbenkian. A ideia é substituir a ênfase nas exigências de resultados pré-estabelecidos, pelo apoio a processos colaborativos com diferentes stakeholders que produzam inovações e mudanças sistêmicas em problemas sociais complexos. “Ao optar por esse novo approach, esse grupo tem colaborado para a construção de uma teoria sobre análise de sistemas e o modo de promover mudanças”, diz Célia Cruz, diretora-executiva do ICE, que representou o Brasil no segundo encontro de fundações da rede Social Innovation Exchange (SIX)[1], realizado no Canadá no início de setembro.
Para expandir esta reflexão para outras regiões, a rede SIX está buscando fundações em todos os hemisférios e a missão de Célia Cruz, como única representante da América Latina, foi começar a fazer um mapeamento de fundações no Brasil que estejam dispostas a financiar mudanças sistêmicas. A primeira reunião da SIX sobre esse tema foi em janeiro deste ano, em Nova York, na Fundação Rockefeller.
Várias fundações que querem financiar inovações sociais que possam gerar mudanças em sistemas estão estudando esta nova forma de financiar. A fundação passa a abrir mão do seu controle sobre o que vai resultar para apoiar processos colaborativos entre lideranças de várias organizações que tenham um propósito, uma visão compartilhada e de longo prazo. Passam a priorizar não apenas o aprendizado de uma organização, mas um aprendizado coletivo que vai alimentando o processo de várias organizações e gerando inovação. Além disso, todos os atores tem um poder compartilhado e são co-responsáveis pelo impacto gerado.
Outro ponto relevante é que estes processos por exigirem muita articulação e colaboração levam muito mais tempo e podem custar mais no curto prazo. Isso acontece porque no jeito tradicional de financiar, de forma mais linear e pragmática, a fundação ditava o resultado em vez de resolver problemas sociais. Com a nova tendência, o interesse da fundação é trazer para o desenho multi stakeholders cuidadosamente escolhidos e promover processos colaborativos que tenham representados diferentes olhares e setores. Espera-se, com isto, a produção de ações mais inovadoras e com maior legitimidade, bem como, um ecossistema mais resiliente a partir destas novas conexões criadas.
“Imagine a importância de uma grande fundação dizer: ‘seremos mais disruptivos se ao invés de recebermos propostas que descrevam o resultado esperado numa determinada temática, solicitarmos propostas de vários proponentes que garantam uma visão alinhada sobre o impacto e a transformação desejada e estejam abertos para criar processos inovadores e colaborativos visando inovações sociais que gerem mudanças sistêmicas’, reflete Célia Cruz”. “O novo paradigma destas fundações é de que não precisam do controle sobre o resultado. Devem garantir que o processo gere um impacto maior e com mais legitimidade”, completa Célia
O grupo de fundações representadas no SIX é muito pragmático e, para avançar, pretende apoiar experimentos concretos nos quais diferentes atores contribuam para criar inovação. Há uma aprendizagem nesse processo, o que torna a comunicação um elemento essencial, tendo em vista que o ecossistema inteiro tem de ser alimentado o tempo todo e compartilhar esse conhecimento.
Riscos e oportunidades
Como o resultado final dos processos de mudanças sistêmicas não pode ser previsto, há necessidade de encontrar financiadores que entendam a sua importância. Para isso é preciso que eles se engajem no processo e que, junto com os atores envolvidos, sejam informados, com transparência, sobre êxitos e falhas. A comunicação, o timing, o engajamento de multi-stakeholders, são alguns dos pilares de processos de mudanças sistêmicas que os diferenciam de processos tradicionais. Financiadores precisam aprender sobre isto e não é fácil, embora seja essencial para construirmos soluções sistêmicas de longo prazo. Ou, como ensina um dos expositores da reunião do SIX, “Quando você entra em processos de mudança sistêmica, o tempo é diferente de quando você financia com controle”.
Isso mostra que a comunicação também precisa ser financiada e há necessidade de ter consciência da diferença entre comunicar projetos e comunicar processos de mudança sistêmica. A escolha da linguagem e das narrativas são igualmente importantes para o avanço das mudanças sistêmicas e para a transformação de modelos mentais.
Outro aspecto relevante para facilitar a mudança sistêmica é a criação de mais espaços de diálogo, escuta e construção de protótipos. Os beneficiários devem participar das discussões, priorizações e desenhos de programas junto com os outros atores. O caminho é dar poder e oportunidades de construção a quem não tem, e trazer para a consciência de quem tem poder, por possuir mais recursos e capital social, que é necessário compartilhar este poder com outros. Essa é a base para uma sociedade mais justa e com mais vozes.
Célia Cruz lembra que no Lab de Inovação em Finanças Sociais da Força Tarefa (FTFS), co-construido com a Aoka Labs e baseado na teoria U (uma das metodologias para apoiar mudanças sistêmicas), foi feita uma curadoria para trazer pessoas do governo, empresas, fundações, ONGs, negócios e financiadores para construir protótitpos que gerem mudanças sistêmicas no campo das Finanças Sociais e Negócios de Impacto. Durante o processo surgiu uma inovação no protótipo “Institutos e Fundações de Impacto” cujo objetivo é aprofundar o entendimento e a prática das fundações e institutos (empresariais, familiares e independentes) nesse campo. Os vários participantes perceberam que uma maneira de gerar esse conhecimento seria investir e experimentar mecanismos financeiros orientados a gerar impacto social. Cada fundação ou instituto deve entrar com US$ 10 mil e já há doze fundações e institutos brasileiros mobilizados. Este é um bom exemplo de protótipo produzido em processo colaborativo, nos moldes recomendados pelas fundações que participam da rede SIX.
[1] A Social Innovation Exchange é uma organização, baseada no Reino Unido, com o foco de criar uma rede global de pessoas, organizações e fundações que trabalhem com inovação social. http://www.socialinnovationexchange.org/home