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Ampla articulação, comunicação e disseminação de conhecimento podem fortalecer cultura de doação no Brasil
Reunidos em São Paulo, idealizadores e investidos do Fundo BIS avaliaram iniciativa e trocaram experiências e desafios.
O brasileiro doa de forma esporádica, na maioria das vezes sem comprometimento com a sustentabilidade das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) e relativamente pouco – 0,2% do PIB (Produto Interno Bruto) -, se comparado a países com maior tradição filantrópica, como Reino Unido e Estados Unidos – 0,5% e 1,4% de seus PIBs, respectivamente.
Esse retrato da cultura de doação brasileira, apontado por pesquisas como CAF World Giving Index, foi o disparador do primeiro edital do Fundo BIS, em 2017, com a finalidade de fomentar a cultura de doação no Brasil.
Incubada pelo Grupo de Institutos Fundações e Empresas (GIFE) com aportes dos Institutos Arapyaú, C&A, Cyrela e Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), a primeira chamada investiu o total de R$ 280 mil em quatro projetos nas frentes de inovação para promoção da cultura de doação; campanhas de comunicação e produção de conteúdo de incentivo à cultura de doação; pesquisa, produção e disseminação de conhecimento; e advocacy e incidência.
Recentemente, os idealizadores das quatro iniciativas apoiadas e as organizações investidoras tiveram a oportunidade de compartilhar experiências, aprendizados e desafios durante um workshop em São Paulo. A sistematização do debate realizado será publicada em breve.
Para Diogo Quitério, gestor de programas do ICE e membro do conselho do fundo, o workshop foi uma oportunidade de olhar com atenção para todo o ciclo do Fundo BIS, do desenho do edital até os resultados alcançados por cada um dos projetos apoiados.
“Mais do que o capital financeiro aportado, considero que o Fundo BIS foi importante para mostrar que há diversos projetos muito interessantes que estão refletindo sobre a cultura de doação como causa, pensando em como engajar mais pessoas, como diminuir as barreiras legais para a doação no Brasil e como utilizar a tecnologia para tornar a experiência de doar mais eficiente e poderosa”, observa.
Para o ICE, o aporte à iniciativa do Fundo BIS é também uma oportunidade de fortalecer o campo das finanças sociais, no qual a doação é relevante para o fortalecimento do Terceiro Setor. Também no campo dos negócios de impacto, muitas vezes as doações para organizações intermediárias que ajudam a estruturar este campo são fundamentais e representam uma importante fonte de capital.
Percepções
Uma das constatações do grupo que se articulou em torno do Fundo Bis é a de que as pautas da cultura de doação no Brasil ainda transitam de forma tímida entre os nichos do investimento social privado e das organizações da sociedade civil.
Nesse sentido, a comunicação foi abordada no debate como essencial para o fortalecimento da causa e disseminação da ideia de doação como elemento-chave para o fortalecimento de uma sociedade democrática, para além da ação filantrópica e voluntária.
Isso posto, o grande desafio comum a todos, tanto investidos, quanto organizações promotoras de iniciativas no campo da cultura de doação, é chamar a atenção de atores como mídia e grandes investidores, que podem contribuir com a popularização da prática de doar.
Para Danielle Próspero, do Estúdio Cais – idealizadora da plataforma Viralize, um dos projetos contemplados pela primeira chamada do Fundo BIS -, outro ator fundamental é a academia, justamente para a produção de mais conhecimento sobre a cultura de doação no Brasil.
Na avaliação da jornalista, um dos pontos fortes do Fundo BIS foi a autonomia no uso do recurso aportado, que permitiu o desenvolvimento de experiências pilotos. “O Fundo BIS permitiu o desenvolvimento de projetos inovadores e ousados por seu caráter livre, ou seja, um recurso para a causa da cultura de doação não vinculado a um projeto ou organização específica. Isso é muito importante e permite que novas iniciativas possam ser criadas e testadas.”
Uma segunda edição do Fundo BIS não está confirmada, mas os diversos atores envolvidos na primeira chamada seguem em diálogo para pensar o futuro da iniciativa e observar seus desdobramentos.
Questões legais
Avanços de ordem legislativa, jurídica e normativa também são fundamentais para garantir a promoção de um ambiente mais favorável à ampliação das doações de interesse público no país. A complexidade da legislação atual; a falta de incentivos fiscais para diversos temas relevantes e para a doação de pessoas físicas; e a incidência de tributos sobre as doações estão entre alguns dos desafios a serem superados nesse tema.
A aprovação, no início deste ano, da Lei Federal 13.800, que regulamenta a criação dos fundos patrimoniais filantrópicos trouxe uma nova perspectiva ao desenvolvimento da cultura de doação no Brasil. De modo geral, os fundos patrimoniais tem como visão perpetuar a causa da organização, já que os recursos recebidos permanecem no fundo, em aplicações financeiras, e apenas os rendimentos são periodicamente resgatados para custear todo ou parte do funcionamento ou incremento de organizações educacionais, de saúde, ambientais, culturais e outras causas de interesse público.
Se por um lado devemos comemorar a legislação dos fundos patrimoniais, por outro lado, ainda convivemos com uma barreira tributária às doações para OSCs: o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). O país é um dos poucos que taxa doações privadas para organizações da sociedade civil. As alíquotas flutuam de 2% a 8% do valor da doação dependendo do Estado e o contribuinte do ITCMD é a OSC que recebe o recurso.
Toda essa estrutura legislativa que sujeita as organizações a perderem um percentual da sua captação que iria para causas sociais, soma-se a uma estrutura burocrática de cobranças de taxas e fiscalização. Uma pesquisa realizada pela FGV –Direito mostrou que a arrecadação aos Estados é baixa e parece não justificar a receita tributária gerada pelo ITCMD na composição dos orçamentos públicos.
Especialistas apontam que mudanças legais relativamente simples como as promovidas pelo estado do Rio de Janeiro no final do ano passado com a sanção da Lei nº 7.786 – que altera a legislação anterior que dispõe sobre o imposto, isentando as OSCs do tributo -, poderiam desonerar as doações a OSCs.
A FGV DIREITO SP lançará no dia 28 de agosto um estudo sobre o assunto no âmbito do projeto Sustenta OSC, uma realização em parceria com o GIFE.