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Entrevista | Maure Pessanha: “Pós-pandemia, o Brasil precisará mais de organizações fortes e inovadoras.”
A diretora-presidente da Artemisia celebra os 15 anos de trajetória da organização pioneira na dinamização do ecossistema de negócios de impacto e faz um balanço de sua trajetória ao assumir a posição de presidente do Conselho da organização.
A Artemisia está comemorando 15 anos e um conteúdo especial conta essa trajetória, que anda junto com a do ecossistema de investimentos e negócios de impacto.
Parceira de longa data do ICE em diferentes frentes, a organização, este ano, realizou com o Instituto uma série de encontros sobre apoio ao empreendedor de impacto destinada a representantes de aceleradoras, incubadoras, instituições de ensino superior e outros atores que prestam suporte a empreendedores. O conteúdo, inédito, reuniu ferramentas, práticas e casos reais que podem inspirar o trabalho das organizações que participaram do ciclo temático.
Em entrevista ao ICE, Maure Pessanha, diretora executiva da Artemisia, fez um balanço da contribuição da organização nos últimos 15 anos para a dinamização do ecossistema e compartilhou sua visão pessoal sobre o caminho adiante.
Com mais de 20 anos dedicados ao empreendedorismo de impacto social, a administradora e especialista em Avaliação de Programas Sociais assume a posição de presidente do Conselho da Artemisia, tendo como uma das atribuições a proposição de uma nova visão de futuro.
Confira a entrevista completa.
ICE: A Artemisia foi pioneira na aceleração de negócios de impacto. Como você percebe o ambiente para o surgimento e desenvolvimento de novos negócios de impacto no Brasil de 2021 em relação ao Brasil de 2006, quando a organização nasceu?
Maure: No Brasil, é nítido que o setor está amadurecendo na qualificação dos empreendedores, na inovação das soluções, nos modelos de negócio e nas formas de financiamento. Neste último ponto, inclusive, inovações importantes surgiram, como o Blended Finance (modalidade de financiamento que combina diferentes fontes de recursos: filantropia, dinheiro público e recursos privados de investidores).
Destaco ainda o avanço da cultura empreendedora no país, que tem mostrado seu enorme potencial para auxiliar as grandes empresas e os governos a enfrentarem os desafios da inovação. Na jornada em direção à inovação aberta com impacto social – que combina ideias internas e externas para acelerar o desenvolvimento de produtos, serviços e processos –, ela se mostra perfeitamente alinhada e à altura da demanda. O modelo, que teve início na cooperação da academia com empresas, não chega a ser uma novidade. Entretanto, a inovação aberta com impacto social é extremamente disruptiva.
Na Artemisia, temos trabalhado fortemente na conexão de negócios a empresas, e mais ainda na aproximação dos negócios de impacto socioambiental com governos. Percebemos que existem inúmeras demandas dos gestores públicos que negócios de impacto podem suprir e, diante dessa constatação, temos atuado para ajudar gestores e empreendedores a conversar, desenhar soluções juntos e viabilizar sua implementação – gerando evidências concretas da resolutividade dos produtos e serviços e a melhoria do serviço público à população.
ICE: E a Artemisia continuará acelerando negócios de impacto?
Maure: Quando pensamos em desafios a serem transpostos, embora os avanços sejam inegáveis, questões do ecossistema relacionadas a diversidade, diálogo entre setores, mensuração e gestão de impacto social continuam prementes. Diante desse cenário, o apoio direto a empreendedores continua sendo fundamental para manter um ciclo positivo de desenvolvimento do ecossistema.
Por isso, a Artemisia mantém o trabalho que tem pontuado a nossa trajetória desde o início. Hoje, nossa intenção e compromisso é o de acelerar os negócios de impacto em diferentes estágios de diversas maneiras. Atualmente, lideramos um consórcio em parceria com a Liga Ventures e a Wayra para acelerar mais de 100 negócios de impacto social e ambiental com o BNDES, no programa BNDES Garagem Negócios de Impacto. Ter um importante agente como o BNDES fomentando o tema no Brasil é um marco e um sinal claro de que novos modelos de negócios que sirvam o país na resolução dos problemas sociais e ambientais deve ser a melhor estratégia de qualquer investidor daqui para frente.
ICE: E quanto a outros aspectos do ecossistema? Que marcos você destacaria considerando outras dimensões da atuação da Artemisia nesses 15 anos?
Maure: Na nossa história, conseguimos identificar muitos marcos bastante relevantes para a organização – e que impactaram o setor. Produzimos um material que conta um pouco do que construímos e aprendemos e está disponível para download em nosso site.
Mais recentemente, temos criado iniciativas em colaboração com outros atores que têm nos ensinado muito sobre o poder e os desafios da verdadeira colaboração. A nossa primeira iniciativa nessa linha foi a Articuladora de Negócios de Impacto da Periferia (ANIP), com A Banca e a FGV-Cenn – iniciativa que visa contribuir para o fortalecimento de negócios de impacto, atuando para que novos negócios nasçam da e para a periferia.
Outras iniciativas são as coalizões que temos criado para impulsionar novos mercados, como a coalizão habitação e, mais recentemente, por conta do contexto da pandemia, estruturamos uma coalizão no tema da inclusão produtiva. Essas coalizões possuem estratégias de apoio direto a empreendedores, inovação aberta e de disseminação de aprendizados com evidências – aliás, um pilar muito importante para nós.
Eu acredito que o futuro é o trabalho em colaboração. Um trabalho que gere evidências concretas de resultados que possam ser compartilhados e que contribuam para o debate da sociedade, dos empreendedores, filantropos e gestores públicos sobre um tema. Na minha visão, no pós-pandemia, o Brasil precisará ainda mais de organizações e iniciativas fortes e inovadoras para fazer frente ao agravamento das desigualdades sociais.
ICE: Recentemente, foi anunciada a sua transição para a posição de presidente do Conselho da Artemisia, tendo como uma das atribuições a contrução de uma nova visão de futuro. Qual é o ponto de partida dessa nova etapa da organização e o que desejam alcançar?
Maure: A Artemisia cresceu e esse crescimento se deve à consistência do trabalho realizado nos últimos 15 anos e à necessidade de estar à altura dos desafios que a sociedade brasileira está vivendo. E, como parte do crescimento, senti a necessidade de trazer novos talentos complementares aos meus e aos da equipe – profissionais incríveis que trouxeram a organização até aqui e que vão levar além. Considero que uma etapa importante da nossa história foi concluída e que está na hora de dar um novo salto. Por isso, a ampliação da equipe atende à visão de futuro do Conselho da Artemisia: preparar a organização para liderar o fortalecimento e a expansão coordenada do empreendedorismo de impacto social e ambiental no país.
O apoio dado pela Artemisia até então – via mecanismos de aceleração proprietários e programas institucionais correalizados – ganhará novos contornos, que estarão profundamente conectados e dedicados à necessidade de criar mecanismos inovadores de suporte, o que passa por soluções de financiamento. A chegada do Luciano Gurgel reforça esse entendimento e predisposição da Artemisia de continuar na vanguarda do ecossistema para maximizar o impacto social e ambiental no Brasil. Nessa nova etapa, nos dedicaremos a construir o arco completo da jornada do empreendedor e, ao mesmo tempo, reforçar a institucionalidade dos programas.
ICE: Considerando a estratégia de atuar com governos e o fato de que em 2022 haverá eleições para o Executivo, que pontos você sugeriria ao ecossistema de impacto acompanhar de perto em planos de governo como pautas de interesse?
Maure: Todas as pautas associadas ao combate às desigualdades são relevantes e dialogam diretamente com o nosso ecossistema e atuação, que é centrada no corpo técnico, no nível municipal.
ICE: É possível compartilhar aprendizados pessoais a partir da sua trajetória?
Maure: Nossa, são tantas coisas que tenho aprendido! Acho que tive muita sorte, não apenas por acompanhar o surgimento e o fortalecimento do ecossistema de negócios de impacto, mas por fazer parte dessa construção, ‘colocando a mão na massa’. Muito do que tenho aprendido, estou divulgando nos artigos – sou colunista do jornal O Estado de S. Paulo, no canal Estadão PME –, nas produções de conhecimento – aliás, a Artemisia tem uma área estruturada que se ocupa dessa produção e disseminação.
Mais recentemente, em parceria com o ICE, montamos um ciclo de formação de incubadoras e organizações de apoio a empreendedores no qual estamos abrindo muitos dos nossos conhecimentos produzidos, ferramentas, guias e modelos para os participantes. O programa está totalmente conectado à ideia de servir de atalho ou ser um facilitador para que outras organizações apoiem, acelerem, incubem negócios de impacto. Essa tem sido a nossa forma de dividir e retribuir o que aprendemos como organização e como equipe.
Pessoalmente, o meu maior aprendizado tem sido no processo de fazer escolhas. Desde a hora que abrimos os olhos, somos convidados a escolher. Fazer escolhas alinhadas à minha essência, à essência da Artemisia. Saber silenciar o barulho externo, dimensionar a necessidade de ocupar um espaço, silenciar o medo de perder algo e tentar me conectar com as coisas que eu acredito, sobretudo o que a Artemisia emana, tem sido um exercício muito importante para mim.
Essa consciência das escolhas, das renúncias implícitas, dos ‘nãos’ necessários e dos ‘sims’, com certeza, são coisas que tenho aprendido muito. Certamente, faria algumas escolhas diferentes nessa jornada, mas tenho a tranquilidade de saber que, ao longo dos anos, fui tentando fazê-las da forma mais consciente possível. Errar os meus erros – não os dos outros – foi muito importante para o meu aprendizado e os da própria Artemisia.